A pergunta pelo SER HUMANO ecoa do Paraíso. Ela é a pergunta do Criador pela sua criatura. A resposta a ela define o caráter da “Missão Evangélica”. Ela irrompe num contexto. – “ADAM onde estás?” Onde você se meteu ADAM. Em outro contexto a pergunta é de Jesus: - “Onde o colocaste?” Diante desta indagação só uma resposta é adequada: - “Senhor, vem e vê!”

A atitude do Criador e do Salvador é a mesma. Ele veio ver o que é feito do SER HUMANO. Ele veio visitá-lo para restaurar a verdadeira imagem e semelhança de Deus. Aliás, o Verbo se fez carne, proclama João para revelar a plena imagem de Deus. O Verbo –Deus se fez gente por inteiro. Esta é a medida de humanidade que Deus requer de suas criaturas a cada geração. Esta pergunta emerge de um contexto. Por isso a resposta também vem de um contexto. Este contexto sempre envolve a criação num momento situado e datado. A resposta à pergunta de Deus mexe com a história do ser humano.

Neste blog manifesta-se uma constante busca de ouvir a pergunta do Criador pelo SER HUMANO e por tentativas de responder a esta pergunta dentro do contexto da cidade. Pois, afinal, somos urbanóides pós-hiper-modernos que habitamos aglomerados citadinos onde temos a vocação de “SERMOS HUMANOS”. Os referenciais definidores do ser e do humano variam de acordo com as filosofias e convicções pessoais. Esta pagina é reflexiva e dialogal. Sem pretensões conclusivas ou dogmáticas. Prefere-se a postura da agulha e da linha que tenta costurar, à função da tesoura que seleciona cortando tudo o que não cabe no molde.

Seja bem-vinda! Seja bem vindo! Seja comigo um construtor do “SER HUMANO”!


quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Por que é importante zelar pela boa imagem da Igreja?

Vocês são a luz do mundo. Não pode esconder uma cidade construída sobre um monte (Mt 5.14a).

Quem não se entristece quando a grande imprensa divulga notícias sobre ‘padres pedófilos’, negociatas de parlamentares ‘evangélicos’, escândalos financeiros de maus ‘líderes’ neopentecostais e outras atitudes perversas no cenário religioso nacional?

Estas atitudes ferem e maculam a imagem de toda a Igreja, mesmo que sejam ações localizadas. Poucos perguntam: qual foi a Igreja ou o grupo religioso envolvido? Quem está sendo denunciado? O senso comum coloca toda esta desgraça na conta da ‘igreja’.

Nós vivemos neste contexto de liberdade e confusão religiosa. Somos uma parte de toda a Igreja. Partilhamos as suas alegrias e sofremos com os seus pecados. O modo de ser e de viver espelha o caráter que temos. Jesus advertiu Não se pode esconder a cidade construída sobre o monte.

O mau testemunho, uma vez publicado, é como abrir um travesseiro de penas sobre um alto monte: o vento se encarrega de espalhar as penas e não há santo nem reza capaz de recolhê-las.

Assim, desde o início, quero sublinhar que a responsabilidade de zelar pela honra, pelos valores e pelo bom testemunho cristão é de toda a Igreja como organização e, simultaneamente, de cada pessoa, cada Comunidade, cada projeto, cada instituição e cada serviço.

Que imagem fazemos de nós mesmos?

Certo dia, visitei um querido Pastor de outra igreja histórica. Busquei-o ansioso para aprender algo novo sobre Missão Urbana.

No fim da conversa, ele declarou-se encantado com o nome de IECLB. Curioso, quis saber a razão deste encanto. Ele chamou a minha atenção para cada uma das palavras que compõem o nome da IECLB. Acompanhe a reflexão comigo:

- Somos Igreja: a nossa identidade está ancorada nas palavras e no ministério de Jesus e dos seus apóstolos. A Igreja é obra da ação do Espírito Santo. O seu vínculo é com Jesus, o Cristo e Senhor da Igreja. A sua base é o Evangelho do Reino de Deus.

As nossas lideranças, reunidas em Concílio Sinodal (1954), assumiram o nome IECLB com a seguinte missão: “ser Igreja de Jesus Cristo no Brasil com todas as consequências daí advindas para a proclamação do Evangelho neste País e para a corresponsabilidade pela formação da vida política, cultural e econômica do seu povo. Portanto, somos Igreja a serviço da transformação desta nação”.

Em contraste às religiões dualistas que apregoam a salvação das almas, sem transformação social, estamos comprometidos com o Evangelho que visa a uma salvação integral das pessoas e da sociedade. O Artigo 3º da nossa Constituição estabelece:

Em obediência ao mandamento do Senhor, a IECLB, através de suas Comunidades, tem por fim e missão:

I – propagar o Evangelho de Jesus Cristo;

II – estimular a vivência evangélica pessoal, familiar e comunitária;

III – promover a paz, a justiça e o amor na sociedade;

IV – participar do testemunho do Evangelho no País e no mundo.

- Somos Igreja Evangélica: o que nos identifica é o nosso compromisso com o Evangelho de Jesus Cristo testemunhado nas Sagradas Escrituras. Por esta razão, somos Igreja Evangélica.

As nossas Comunidades, ao longo dos anos, são identificadas como ‘Comunidades Evangélicas’. As nossas escolas, como ‘Escolas Evangélicas’, em contraste com as Comunidades e escolas católicas e luteranas da IELB.

O verdadeiro tesouro da Igreja é o santo Evangelho, não a instituição nem a estrutura, nem as liturgias, nem os templos... Assumir a identidade evangélica nos compromete com a salvação por graça mediante a fé. Esta fé só pode vivida em amor, a serviço do outro, em busca da liberdade, da justiça e da paz social. Portanto, o Evangelho não se reduz a uma piedade religiosa.

- Somos Igreja Evangélica de Confissão Luterana: Como Igreja, somos herdeiros da Reforma protestante do século XVI, liderada por Martim Lutero. Somos parte de uma família presente em muitos países. A Confissão Luterana esta comprometida com o brado dos Reformadores: Deixem Deus ser Deus! Contra os mercadores de fé, de salvação e de bênção, eles reafirmaram Existe um só mediador entre Deus e os homens: Jesus Cristo, este crucificado e ressurreto.

Esta é a nossa tradição. Ela não é uma gaiola que aprisiona os dons e as manifestações do Espírito Santo, mas nos vincula ao testemunho daquelas pessoas levantadas no poder do Espírito Santo para restaurar os verdadeiros fundamentos da Igreja de Cristo.

- Somos Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil: desde os anos 1970, a IECLB adotou o símbolo elaborado pela Federação Luterana Mundial (FLM), o globo terrestre sob a cruz de Cristo, tendo como moldura a coluna que marca a arquitetura da nossa capital federal, Brasília. Este símbolo é significativo (pelo seu caráter ecumênico que nos liga à una, santa e universal Igreja de Cristo) e desafiador (porque nos lembra que somos família evangélico luterana no Brasil).

Em síntese, para cumprir a missão de Deus confiada a nós, bastaria que cada evangélico luterano honrasse o nome da IECLB. Este nome nos confere identidade no pluralismo religioso brasileiro.

Como zelar pela boa imagem da Igreja?

Como país, somos, hoje, uma sociedade urbanizada e massificada. Nesta realidade, a pessoa pergunta-se: Quem sou eu nesta massa de gente? Onde encontro um ancoradouro que me confere valor e dignidade? Onde encontro um lar espiritual?

Quando as questões existenciais afloram no espírito humano, a pessoa busca respostas. Uma das portas a ser procurada neste momento é a ‘religião’. Afinal, todo progresso da ciência e todos os ataques ideológicos não conseguiram erradicar a necessidade de espiritualidade. Pelo contrário, geraram angústias que não conseguiram resolver. Ressurge, daí, o anseio pelo sobrenatural, a busca do místico, a necessidade de experiências que conferem sentido à existência...

O que o ‘urbanoide pós-moderno’ encontra quando visita os nossos cultos dominicais? Ele entra no templo como um desconhecido e sai como um estranho/ignorado ou existe alguém que nota a sua presença, vai ao seu encontro e o acolhe no seio da Comunidade?

Onde alguém sentir-se acolhido e amado, vai sentir-se em casa e, desta casa, fará a sua casa. O que Jesus espera dos seus seguidores é que as pessoas se sintam amadas por Deus por meio da Igreja. Cuidar da boa imagem da Igreja é acolher as pessoas no amor de Jesus.

A Igreja forma os cidadãos que a sociedade precisa

Na função de Pastor Regional, certo domingo, presidi a consagração de um templo. A Comunidade festiva estava reunida com as autoridades. Na ocasião, diversas pessoas fizeram uso da palavra diante do templo. Entre elas, chamou a minha atenção a palavra do Prefeito, um jovem Médico que afirmou com muita tranqüilidade: ´Enquanto eu for Prefeito neste município, faço questão de prestigiar o trabalho da Igreja, porque a Igreja forma os cidadãos que a nossa sociedade precisa!’.

Este Prefeito soube expressar em uma só sentença qual deve ser o foco da atuação missionária da Igreja na sociedade. Ele percebeu que o caráter do cristão é vital para a sociedade.

O zelo pela imagem da Igreja significa nunca esquecer que somos cidadãos do Reino de Deus e, simultaneamente, cidadãos em nosso país.

A qualidade dos nossos relacionamentos

Zelar pela boa imagem da nossa Igreja está intimamente vinculado à qualidade dos nossos relacionamentos. Assim como, na família não basta aos pais serem genitores, é preciso dedicação, presença, afeto, tempo e amor aos filhos. Este cuidado produz um clima de confiança. A confiança gera estabilidade emocional dos filhos. Esta os habilita a um crescimento equilibrado rumo à maturidade adulta.

Nós somos a família de Deus. Na Comunidade ocorre o mesmo processo. Não bastam boa pregação e bons programas. A imagem da Comunidade está relacionada à maneira como o amor é vivenciado. Vejam como eles se amam! Era a marca das comunidades primitivas.

Zelar pela nossa imagem tem a ver com o senso de estética

Na função de Pastor Sinodal, tive a incumbência de visitar Comunidades e avaliar os seus Ministros. Outro dia, em companhia de um colega, ao visitar uma Comunidade onde o templo estava mal cuidado, o meu colega fez uma observação irônica ‘Aqui, a gente tem a impressão que o patrão viajou em férias’.

As aparências podem enganar, mas nem sempre. Muitas vezes, revelam o coração da pessoa ou do grupo. Fico encantado quando visito as cidades serranas do Rio Grande do Sul: ruas limpas, praças floridas e jardins dos templos ajardinados.

Honramos o ser Igreja pelo trabalho para o bem da cidade

O profeta Jeremias exorta a Comunidade dos exilados para orarem pela paz e prosperidade da Babilônia Busquem a prosperidade (Shalom!) da cidade para a qual eu vos deportei e orem ao Senhor em favor dela, porque a prosperidade de vocês depende da prosperidade dela (Jr 29.7).

A presença cristã pode ser marcante na cidade. Ao estudar a história do planejamento urbano de Curitiba/PR, percebi que a presença de lideranças cristãs do quilate do Padre Lebret marcou a visão dos planejadores urbanos. Curitiba foi planejada em função das pessoas, seu bem-estar, sua qualidade de vida. Dezenas de parques bem arborizados e equipados, muitos quilômetros de ciclovias, transporte coletivo integrando, etc., testemunham este enfoque.

A participação no Instituto São Leopoldo 2024 está sendo a minha mais recente experiência de engajamento urbano. Somos um grupo de voluntários independentes que interage com os responsáveis diretos pela administração municipal, buscando a melhor qualidade de vida para a cidade. É uma maneira de demonstrar o amor pela cidade.

Conclusão

Cuidar da boa imagem de nossa Igreja é ser fiel o Evangelho e assumir as suas implicações para a sociedade. Isto é tarefa de todos.

Após servir na IECLB por quase quatro décadas, engajado nas ações de missão urbana e tendo conhecido mais de perto a realidade do mundo evangélico brasileiro, coloco-me de acordo com a conclusão do meu compadre Eurico: ’Quanto mais convivo e conheço o mundo evangélico brasileiro, mais alegria eu sinto em ser evangélico luterano’.

N.A - Este artigo Fo publicado no Jornal Evangélico Luterano, edição 10/2011, com exceção dos parágrafos grifados.

Arzemiro Hoffmann, Ex-Pastor Regional e Sinodal, Professor de Missiologia da Faculdade de Teologia Evangélica (Fatev), em Curitiba/PR, Licenciatura plena em Filosofia, Bacharelado e Mestrado em Teologia.